Se você já teve câncer, concluiu o tratamento e hoje vive sem acompanhamento oncológico regular, é natural que surjam dúvidas sobre como isso pode afetar seu acesso a planos de saúde. Uma das perguntas mais frequentes é: “câncer curado é doença preexistente para o plano de saúde?”
Essa é uma questão que envolve não apenas definições médicas, mas também interpretações jurídicas e normas da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Neste artigo, vamos explicar, com base na legislação e na jurisprudência mais recente, o que diz a lei, o que os tribunais têm decidido, e como você pode se proteger.
O que você vai encontrar neste artigo
- O que é doença preexistente segundo a ANS
- Quando o câncer curado pode (ou não) ser considerado preexistente
- Jurisprudência recente que protege o paciente
- Direitos do consumidor na contratação do plano
- Como agir diante da negativa de cobertura
- Modelos de recursos
- Quando é hora de procurar um advogado
O que é doença preexistente?
Segundo a ANS, doença preexistente é aquela que o beneficiário já sabia possuir no momento da contratação do plano de saúde. Ou seja, não basta a doença existir: é essencial que haja ciência do consumidor sobre ela.
Isso está previsto na Resolução Normativa nº 465/2021 da ANS. A operadora só pode impor Cob ertura Parcial Temporária (CPT) para doenças declaradas no formulário de saúde no momento da adesão.
Câncer curado é doença preexistente?
Não necessariamente. Se o tratamento foi encerrado, o paciente recebeu alta e não está mais em acompanhamento clínico, o câncer curado é doença preexistente? A resposta é NÃO.
Planos de saúde não podem considerar como preexistente uma doença que já foi superada, sob pena de cometer ato abusivo. A exceção só ocorre quando:
- O tratamento foi recente e ainda há possibilidade de recidiva.
- Há acompanhamento clínico regular.
- O paciente declarou a doença no formulário de adesão.
Jurisprudência protege o consumidor
Decisões recentes têm afastado a negativa de cobertura por suposta doença preexistente. Destaca-se a Apelação Cível TJ-MS nº 0801600-41.2022.8.12.0002, julgada em março de 2024:
“A recusa de cobertura, sob a alegação de doença preexistente, é ilícita se não houve a exigência de exames médicos prévios à contratação ou a demonstração de má-fé do contratante”.
A decisão destacou ainda que, mesmo havendo carência, o tratamento em casos de urgência ou emergência não pode ser negado após 24 horas da contratação, conforme a Súmula 597 do STJ.
O plano pode negar cobertura por câncer antigo?
Não pode, se não houver declaração da doença ou prova de má-fé. A negativa com base em uma doença tratada e superada, sem que tenha sido declarada ou esteja ativa, é considerada abusiva pelo Código de Defesa do Consumidor.
O STJ já decidiu que o consumidor não está obrigado a informar doenças que não mais possuem manifestação clínica no momento da contratação.
Câncer impede a aceitação no plano?
Não. Nenhuma operadora pode negar aceitação com base em doença preexistente. O que pode haver é a aplicação da Cobertura Parcial Temporária (CPT), com carência de até 24 meses para procedimentos de alta complexidade.
A negativa de contratação por motivo de saúde configura discriminação, vedada pelo artigo 14 da Lei 9.656/98.
O que é CPT e como funciona?
A Cobertura Parcial Temporária (CPT) permite à operadora limitar por até 24 meses a cobertura de:
- Cirurgias
- Leitos de alta tecnologia (UTI/CTI)
- Procedimentos de alta complexidade
Durante esse tempo, o consumidor tem direito à cobertura ambulatorial (consultas, exames simples, exames laboratoriais comuns). Após os 24 meses, a cobertura passa a ser integral.
Exemplo prático
Maria, 47 anos, curou-se de um câncer de mama há 5 anos. Sem acompanhamento regular desde então, contratou um plano de saúde e, após 6 meses, precisou de uma tomografia. A operadora negou alegando que câncer curado é doença preexistente.
Essa negativa é ilegal, pois:
- Não houve declaração da doença
- O câncer está curado e sem acompanhamento
- Não há prova de má-fé
O que fazer em caso de negativa?
- Solicite a negativa por escrito
- Registre reclamação na ANS (Disque ANS 0800 701 9656 ou site)
- Procure um advogado especialista em Direito da Saúde
Modelo de recurso administrativo
Prezado(a) Senhor(a),
Venho, por meio deste, solicitar a revisão da negativa de cobertura do procedimento [especificar], com base na alegação de doença preexistente. Informo que não possuo acompanhamento clínico relacionado à doença alegada há mais de [X] anos e que não houve declaração da mesma no momento da contratação.
Solicito, portanto, a cobertura do procedimento solicitado, sob pena de adoção das medidas legais cabíveis.
Atenciosamente,
Quando procurar um advogado?
- Se a negativa persistir mesmo após recurso
- Se houver urgência no tratamento
- Se a operadora quiser rescindir o contrato
O advogado especialista em Direito da Saúde pode:
- Propor ação com pedido de liminar
- Garantir o início imediato do tratamento
- Pedir indenização por danos morais
Conclusão
Se você teve câncer, curou-se e hoje não precisa mais de acompanhamento regular, seu plano de saúde não pode classificar isso como doença preexistente.
A negativa de cobertura nessas condições é considerada abusiva pela legislação e pela jurisprudência brasileira. Conhecer seus direitos é o primeiro passo para não ser lesado.
Se você está enfrentando essa situação, fale com um advogado especialista em direito da saúde para garantir seus direitos e sua tranquilidade.
Gabriel Bergamo, advogado especialista em direito da saúde e planos de saúde.