A decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo no processo nº 1111448-15.2024.8.26.0100 trouxe mais um capítulo importante no enfrentamento das práticas abusivas por parte de operadoras de planos de saúde, especialmente quando envolvem contratos coletivos por adesão. A SulAmérica, uma das maiores seguradoras do país, teve sua ação de execução extinta pela Justiça, que reconheceu a ilegitimidade da cobrança de mensalidades após o pedido de cancelamento do contrato por parte do consumidor.
1. Entenda o Contexto: Ação de Execução Proposta pela SulAmérica
A SulAmérica ajuizou ação de execução com base em supostos valores devidos por mensalidades não pagas, mesmo após o consumidor ter formalmente solicitado o cancelamento do plano de saúde em abril de 2023. A seguradora se baseou na cláusula contratual que previa aviso prévio de 60 dias, exigindo o pagamento de mensalidades nesse período, mesmo sem prestação de serviço.
Essa exigência, segundo a defesa do executado, violaria o Código de Defesa do Consumidor e normas mais recentes da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar).
2. Falsa Coletividade e Cláusula Abusiva: O Que Está em Jogo?
A principal discussão girou em torno da legalidade da cláusula contratual de aviso prévio, que obrigaria o consumidor a pagar mais dois meses após o cancelamento. A seguradora se amparava na antiga Resolução Normativa nº 195/2009 da ANS, que previa essa possibilidade para planos coletivos por adesão.
Contudo, essa regra já havia sido anulada pela Resolução Normativa nº 455/2020, que reconheceu os efeitos da Ação Civil Pública nº 0136265-83.2013.4.02.5101, movida pelo Procon-RJ, a qual declarou abusiva e nula a exigência de fidelização com multa ou cobrança extra após o pedido de desligamento.
3. A Decisão Judicial: Fim da Execução e Reconhecimento da Abusividade
Ao analisar a exceção de pré-executividade, o juízo da 20ª Vara Cível de São Paulo acolheu integralmente os argumentos da defesa, entendendo que:
- A cláusula de aviso prévio de 60 dias é nula, por contrariar o CDC e a nova regulamentação da ANS.
- O pedido de cancelamento formulado em 17 de abril de 2023 encerrou validamente a relação contratual.
- Não havia mais título executivo válido, tornando a execução inexigível.
Com isso, a magistrada extinguiu o processo com base no art. 485, VI, do CPC, ordenando ainda o levantamento de valores arrestados da conta bancária do executado e condenando a SulAmérica ao pagamento de custas e honorários.
4. Qual o Impacto Dessa Decisão Para Outros Consumidores?
Essa decisão reforça o entendimento jurisprudencial de que os contratos de plano de saúde coletivo por adesão devem respeitar os princípios do Código de Defesa do Consumidor, especialmente quanto à liberdade de cancelar o contrato sem penalidades abusivas.
Em outras palavras, consumidores que se deparam com cláusulas exigindo aviso prévio ou multa por cancelamento de contrato podem contestar essas cobranças na Justiça e buscar a restituição de valores pagos indevidamente.
5. O Que Diz a ANS e Como Isso Afeta os Contratos Atuais?
Com a edição da RN nº 455/2020, a ANS revogou o parágrafo único do art. 17 da RN 195/2009. Na prática, isso significa que não pode mais haver fidelização obrigatória ou cobrança de aviso prévio em contratos coletivos por adesão, salvo quando houver cláusula expressa, clara e baseada em negociação real — o que raramente ocorre nesse tipo de contrato.
Ou seja, operadoras que continuam impondo tais exigências estão agindo contra a regulação vigente.
6. O Que Fazer Se Você Está em Situação Parecida?
Se você solicitou o cancelamento do seu plano de saúde e mesmo assim foi cobrado por meses posteriores, ou teve valores debitados automaticamente, essa cobrança pode ser considerada indevida.
Nestes casos, recomenda-se:
- Guardar o comprovante de cancelamento ou protocolo de atendimento;
- Não efetuar o pagamento de boletos indevidos;
- Consultar um advogado especialista em Direito da Saúde para ajuizar ação de declaração de inexistência de débito ou até mesmo uma ação indenizatória.
7. Jurisprudência Reforça a Posição do Consumidor
Tribunais têm reiteradamente reconhecido que:
“A cláusula de fidelização em contratos coletivos por adesão é nula, pois impõe ao consumidor obrigação excessivamente onerosa.”
(TRF2, ACP nº 0136265-83.2013.4.02.5101)
Além disso, a Súmula 469 do STJ estabelece que o Código de Defesa do Consumidor se aplica aos contratos de plano de saúde, inclusive aos coletivos.
8. O Papel do Advogado Especialista em Direito da Saúde
Em situações como essa, o acompanhamento jurídico especializado é fundamental para:
- Avaliar a legalidade das cláusulas contratuais;
- Propor ações judiciais para suspensão de cobranças indevidas;
- Requerer devolução de valores e reparação por danos morais, quando cabível;
- Garantir a plena defesa dos direitos do consumidor, especialmente em contextos de vulnerabilidade.
9. Decisão Reforça a Fiscalização Sobre Abusos das Operadoras
O caso serve de alerta para as operadoras de saúde, que continuam tentando aplicar cláusulas declaradas ilegais. A fiscalização judicial, especialmente com base na legislação consumerista, vem se mostrando cada vez mais eficaz em proteger os usuários de práticas abusivas.
10. Conclusão: Uma Vitória Para os Consumidores
A extinção da execução movida pela SulAmérica representa mais que um precedente isolado — ela consolida a posição da Justiça na defesa do consumidor diante de abusos contratuais praticados por operadoras de planos de saúde.
Esse tipo de cobrança, já declarada ilegal pela ANS e pelo Judiciário, não pode mais ser tolerada. E consumidores que se encontram na mesma situação devem ser orientados a buscar seus direitos.
Se você está enfrentando essa situação, fale com um advogado especialista em direito da saúde para garantir seus direitos e sua tranquilidade.